quinta-feira, 8 de janeiro de 2009
Frans Post - A percepção da paisagem na produção artística do Brasil holandês.*
Falar da percepção da paisagem na produção de artistas estrangeiros no Brasil é falar da sua invenção em um tempo no qual sua identidade era atribuída pelo olhar do outro. Época em que o Brasil era objeto do pensamento de um outro, para nós, Frans Post.
Com a unificação das coroas ibéricas, em 1580, por Felipe II de Habsburgo, rei de Espanha, os holandeses, que mantinham boas relações comerciais com Portugal, tiveram de buscar as mercadorias que antes compravam de Lisboa, nas regiões de origem dominadas por seus inimigos, os espanhóis. Criou-se a Companhia das Índias Ocidentais para controlar o comércio com as terras da América e da África localizadas entre o trópico de Câncer e o cabo da Boa Esperança, a Terra Nova e o estreito de Magalhães.
Aproveitando a experiência acumulada pelos marinheiros holandeses, a primeira investida contra o Brasil foi na Bahia, cuja capital foi conquistada em 1624. Porém, no ano seguinte, foi retomada pelas forças de Dom Fradique de Toledo. A segunda investida alcançou um sucesso tão grande que, de 1630 até 1654, a região que vai do Sergipe ao Maranhão, permaneceu sob a tutela da Companhia das Índias Ocidentais. A princípio, a região foi governada por um conselho de cinco membros, a seguir, entre 1636 e 1644, pelo conde João Maurício de Nassau-Siegen, nomeado governador e almirante-geral do Brasil holandês. Seu governo revelou-se extraordinariamente fecundo em realizações culturais e artísticas, e ficou conhecido como Período Nassau.
Em 1630, Recife era um lugarejo com menos de 200 casas; dez anos depois transformou-se numa cidade com 2.000 edificações e deixou de ser um pequeno embarcadouro a serviço da capital, Olinda, para tornar-se a sede do Brasil holandês. Devido a suas dimensões, 100.000 metros quadrados, a cidade obrigou a adoção de formas arquitetônicas em uso na Metrópole, dominada pela verticalidade, com fachadas estreitas que se elevavam em dois e mais pisos, terminando em tetos agudos. Um exemplo dessa atividade é a ilha de Antônio Vaz. Não passava de um local inóspito e pantanoso. Nassau saneou a região, uniu-a à capital por várias pontes e nela ergueu seus palácios provavelmente sob orientação do arquiteto Pieter Post. Seguindo o Conde, diversos funcionários graduados da Companhia das Índias Ocidentais o imitaram e ali construíram suas residências, permanecendo em Recife somente os armazéns, as oficinas e as repartições públicas. Uma cidade holandesa nasceu no Brasil, que o Conde orgulhosamente batizou de Mauritsstad, ou Cidade Maurícia.
Maurício de Nassau trouxe para o Brasil, dentre outros prováveis, os pintores Frans Post e Albert Eckhout, cuja importância não reside em seu pioneirismo, visto que não foram os primeiros artistas europeus a trabalhar no Brasil, mas em outros motivos: foram os primeiros a abordar, no Brasil e na América, assuntos não religiosos, como paisagens, retratos, figuras humanas e de animais ou naturezas-mortas.
De todos os artistas que trabalharam no Brasil holandês, Frans Janszoon Post foi o mais importante. Pouco se sabe sobre o seu aprendizado, feito talvez, sob a orientação do irmão arquiteto Pieter Post. Tinha 24 anos quando Nassau o convidou para vir ao Brasil. Parece ter-se tornado íntimo do Conde, residindo no palácio das Torres. Desenvolveu intensa atividade, não só na elaboração de suas paisagens, como também na fixação de vistas de portos e de fortificações. Regressou à Holanda antes de Nassau. Em 1646, tornou-se membro da Confraria de São Lucas de Haarlem; casou-se em 1650, enviuvando-se em 1664. Faleceu em 1680, tendo passado os últimos anos de vida entregue ao alcoolismo.
Frans Post não foi artista de grande produção, menos de 150 pinturas de sua autoria subsistem catalogadas. Sua obra pode ser dividida em três períodos: antes, durante e depois da permanência no Brasil. Logo após sua chegada, executou a Vista de Itamaracá (Museu de Haia), um dos raros quadros que apresentam o mar, e O Rio São Francisco e o Forte Maurício (Museu do Louvre), que inicialmente foi catalogado como uma paisagem do Senegal. Da permanência brasileira existem ainda três obras no Museu do Louvre: Carro de Bois (1639), que fez parte dos presentes brasileiros que, em 1678, Nassau ofereceu a Luís XIV da França, já evidenciando o amor à minúcia que Post conservaria até o último de seus quadros; Paisagem das Cercanias de Porto Calvo (1638), assinada F. Correo, tradução portuguesa de F. Post; e Forte dos Reis Magos (1639).
Pode-se imaginar o impacto sofrido por Post, acostumado à suave luminosidade dos campos holandeses, ao se defrontar com a áspera vegetação tropical, povoada de uma fauna insólita, sob uma luz intensa. Causa admiração como esse artista, em suas pinturas realizadas no Brasil, conseguiu traduzir o pitoresco da terra e do povo, a paisagem brasileira, ou do nordeste do Brasil pelo seu olhar europeu, holandês, o padrão de referência para a sua sensibilidade estética, sem deixar de ser pictórico.
Porém, embora se subordinasse retratar fielmente a paisagem, Post soube evitar excessos para não sobrecarregar as obras. No dorso da Vista de Itamaracá, lê-se, em holandês antigo: “A Ilha de Itamaracá, vista do sul; a cidade está ao alto da montanha e o Forte de Orange ao sopé, junto do mar. Desta maneira montam os portugueses”. Por essa inscrição, percebemos como as obras desses artistas eram vistas: meros documentos comprobatórios, relegando a qualidade artística a segundo plano.
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http://sitededicas.uol.com.br/clip_pe0.htm
*Trabalho final da disciplina História da Arte no Brasil I, professor Dr. Renato Palumbo Doria, na UFU-MG, apresentado no 1º semestre de 2008.
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